quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

"Esvaziar Direito Penal causará desordem social"

Princípio da bagatela


"Esvaziar Direito Penal causará desordem social"

Por Pedro Canário

A aplicação do princípio da insignificância a qualquer pequeno delito resultará na “completa desordem social” e na “perda de confiança no Poder Judiciário”. O entendimento é do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao julgar recurso de acusado de furto de alguns objetos de uma casa, no total de R$ 200. Para o TJ, o conceito existe apenas na doutrina, e não está regulamentado em legislação. O réu foi preso em flagrante.

Na primeira instância, o juiz decidiu que deveria se aplicar o princípio da bagatela — ou insignificância. Segundo a sentença, o homem havia furtado dois grampeadores, uma fechadura de porta, duas caixinhas de som de computador, duas lâmpadas, uma almofada de carimbo, uma pistola de cola quente, um livro escolar e um álbum de fotos. Foi enquadrado no artigo 155, parágrafo 4º, inciso I, do Código Penal, que versa sobre furto. E absolvido pelo artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal — que libera o réu quando o fato da acusação não constitui infração penal.

De acordo com o juiz, o caso pede a observação no conceito da “intervenção mínima do direito penal”. O próprio julgador de primeiro grau reconhece que tal pensamento só pode ser aplicado “em casos excepcionalíssimos, como o ora objeto de perquirição”. Diz a sentença que o valor dos objetos furtados não é capaz de “ofender o bem jurídico tutelado”, e por isso não estaria tutelado pelo Código Penal. O juiz afirmou ainda que a soma dos valores dos objetos constitui cerca de um terço de um salário mínimo. Por isso, aplicou o princípio da insignificância e absolveu o réu.

Só na doutrina

O Ministério Público recorreu, e o TJ do Rio reformou a decisão. Com isso, determinou que o caso volte à primeira instância para que a Ação Penal continue a ser instruída.

Segundo o acórdão do Tribunal, o princípio da insignificância não está descrito na legislação brasileira. É “fruto de mera construção doutrinária”, segundo a desembargadora Eunice Ferreira Caldas, relatora do caso na 8ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Ela cita jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ao afirmar que o valor furtado não pode ser o único motivador da aplicação da bagatela. Conta que, no caso, há indícios de arrombamento da casa, o que ainda deve ser apurado. E completa: “tal princípio só deve ser aplicado em hipóteses excepcionais e não nos casos recorrentes em nosso cotidiano, sob pena de se dizer que é permitido furtar, desde que o bem subtraído não ultrapasse um determinado valor”.

Por fim, a desembargadora conclui de forma apocalítica: “Se a norma penal for esvaziada, o resultado será a completa desordem social, a falta de estabilização do conflito, a perda de confiança no Poder Judiciário, repartindo-se com a sociedade honesta o incentivo à realização de pequenos delitos.” Se for condenado, o réu pode pegar dois oito anos de prisão, além de multa.

Pedro Canário é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 27 de dezembro de 2011

5 comentários:

Renato Santos disse...

cara, esse blog vale ouro. Escreva mais. Parabéns.

Renato Santos disse...

Sugestão: em tempos de twitter que tal montar um para o ibccréu ?? Acho o diálogo muito válido em momentos de reforma do Código Penal e CPP. Abraço e parabéns pelos textos.

Renato Santos disse...

Olá prezado, há uma legião de admiradores leitores do seu site. Poderia já ter um twitter? Os textos são ótimos. Parabéns.

Renato Santos disse...

Olá, parabéns pelo site. Os textos são ótimos. Já tem uma conta no twitter? Gostaria de seguí-lo. Tens uma legião de admiradores. abraço

Renato Santos disse...

essa decisão bem que poderia ir para o seu blog http://marcelomisaka.wordpress.com/2011/03/03/principio-da-insignificancia-e-a-teoria-das-janelas-quebradas/