sexta-feira, 30 de maio de 2008

DESTAQUE JURISPRUDENCIAL - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

"É impossível o reconhecimento da atipicidade do crime de furto por aplicação do princípio da insignificância ou de 'furto de bagatela', não consagrados pela legislação penal brasileira, de modo que, violada efetivamente norma penal, deve ser responsabilizado o agente infrator, inimportando o valor da coisa subtraída e sua insignificância no contexto econômico ou no patrimônio da vítima ou do réu, não implicando a ausência de lesão em descriminação, pois, independentemente de valores reais econômicos, o que se preserva com a responsabilização do agente que se dispõe a burlar a lei penal são os valores morais, cobrados pela sociedade." (TACrimSP, AC. 1330533/5, Rel. Luis Soares de Mello, 11ª Câmara, DJ. 11.11.2002).

A PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO SOBRE O QUERIDISMO PENAL

Desembargador Jacque T`enrabau.
Membro fundador do IBCCRÉU, autor do livro Direito Penal Total.

Certos tempos atrás ocorreram duas situações em meu cotidiano e que me levaram a refletir sobre a esquizofrenia existente em nossa sociedade: enquanto o povo brasileiro, em sua maioria, clama por Justiça, maior rigor nas leis, altas punições para os criminosos, o Congresso Nacional e parte do Poder Judiciário adotam evidentemente a postura do “queridismo penal”, aplicando o máximo de benefícios aos infratores da lei.
MÁXIMAS DO IBCCRÉU


As vozes que clamam a favor do Direito Penal Mínimo, no contexto atual, se ressentem, cada vez mais, de sustentação social, na medida em que a população, assolada diariamente pela atuação impune dos criminosos, e revoltada com a omissão estatal, clama por um Direito Penal mais forte, mais atuante, mais condizente com a realidade enfrentada pela parcela maior da coletividade, que não tem condições de se esconder sobre o manto de teorias penais ilegítimas. (O Direito Penal Máximo, in Revista APMP, ano IV, nº 35, p. 48).
As situações que ocorreram na mesma semana dizem respeito ao meu netinho, de nove anos de idade. Estava com ele em um Shopping Center e queríamos assistir a um filme – A Bússola de Ouro (saga de uma criança que acha uma bússola mágica e passa a viver várias aventuras com seres mitológicos e mágicos) - mas não pudemos assistir já que o limite mínimo de idade era de 10 (dez) anos. Eu, como um bom cumpridor dos meus deveres, acolhi a exigência imposta.
Dois dias depois, também com meu netinho, fui ao hospital para visitar um parente doente. Naquele local, também não foi permitida a entrada da criança, já que o limite mínimo de idade para ingresso no nosocômio era de 12 anos (segundo a recepcionista, para evitar riscos às crianças, tais como contaminações e também para que não presenciasse eventualmente alguma cena mais forte de morte ou acidente).
Pois bem, assistindo ao noticiário houve cobertura sobre mais uma das inúmeras rebeliões em presídios que acontecem todas as semanas pelo país, sendo que foram feitos reféns várias mulheres e crianças de todas as idades, inclusive bebês, já que o motim ocorreu em dia de visita.
Pensei comigo: uma criança não pode assistir a um filme dirigido ao público infanto-juvenil, nem fazer uma visita em hospital, mas pode entrar em um presídio onde se encontram assassinos, estupradores, maníacos e facínoras de todo tipo? E o direito das crianças e adolescentes a não ser expostos a riscos e a conviverem em ambiente sadio para sua formação?
Dirão os defensores dos réus que a criança tem direito a conviver com seu familiar, ainda que estando recluso em presídio. Contudo, é de se ponderar entre o direito à convivência e o direito à vida e dignidade destes infantes que estão expostos a todos os perigos que, diga-se de passagem, é provocado por seus próprios parentes que estão reclusos e que hoje em dia, nem mesmo respeitam mais a então regra de outro existente nos presídios: não fazer rebelião em dia de visita (isto foi rompido desde que o PCC organizou rebeliões simultâneas em presídios de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul).
Por que estes fatos me levaram a refletir sobre a dissonância entre o princípio democrático (vontade do povo) e o queridismo penal? Porque em todas as pesquisas de opinião, consultas, conversas de botequim, almoços de domingo, percebemos a revolta da população contra a balbúrdia e a desordem criminosa, enquanto o Congresso Nacional e parte do Poder Judiciário, ao invés de se afigurarem como uma caixa de ressonância da população, atuam sistematicamente em dissonância, liberalizando e aplicando um garantismo que é extremamente prejudicial à sociedade brasileira.
Apenas para que fiquemos em poucos exemplos em relação ao Poder Legislativo – todos já convertidos em lei, sem contar os inúmeros projetos de lei que tramitam no Congresso – pode-se citar a nova Lei de Tóxicos, que praticamente descriminalizou a conduta do uso de entorpecente, já que proibiu ao magistrado a conversão da pena restritiva de direito à privativa de liberdade.
Esta lei colocou o magistrado em uma situação, para dizer o mínimo, ridícula, pois caso o usuário não cumpra a pena que lhe foi imposta, restará ao Poder Judiciário adverti-lo e aplicar uma multa (?!?!).
Ora, o cidadão que não respeita sua família, que vende tudo que tem para conseguir entorpecente, e quando não tem mais nada, furta da própria mãe para sustentar seu vício, vai se preocupar em tomar uma “bronca” do Juiz e com a aplicação de uma multa?
O que aconteceu neste caso é que os Deputados e Senadores não tiveram a coragem de enfrentar a população e assumir a descriminalização do uso de entorpecentes e criaram esta figura esdrúxula de crime sem pena.
Às vezes, a atuação do Poder Legislativo acontece de forma velada, como ocorreu com o Estatuto do Desarmamento em sua edição e agora com nova edição de Medida Provisória para entrega de armas. Todos que operam com o Direito observaram que, com a previsão de entrega voluntária de armas, inclusive com indenização, houve a abolitio criminis do crime de posse de arma, inclusive com milhares de processos sendo extintos. Agora, nova oportunidade foi dada para a entrega de armas pela Medida Provisória 417/2008, sem que nenhuma exceção fosse feita sobre a permanência da criminalização da conduta àqueles que já foram presos, condenados ou estão sendo processados por posse ilegal de arma. Alguém tem dúvida de que este “esquecimento” foi proposital para beneficiar todos os infratores com nova abolitio?
Em relação ao Congresso Nacional até que não há muita surpresa, pois muitos – senão a maioria – dos que estão lá são objeto de processos criminais, ações de improbidade e investigações das mais variadas sobre todos os tipos de delitos que se possa imaginar.
Contudo, em relação ao Poder Judiciário, não se consegue entender o porquê desta posição tão lesiva à sociedade em geral e tão dissonante à vontade do povo.
Cito apenas dois exemplos. O primeiro deles diz respeito à posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal no sentido de ser inconstitucional a vedação de progressão de regime ao crime hediondo. Ora, esta decisão foi extremamente prejudicial à sociedade brasileira, colocando de uma só vez milhares de bandidos nas ruas com o cumprimento de apenas um sexto de suas penas, levando a uma situação de aumento de violência.
Ressalte-se que o próprio Supremo já tinha se posicionado antes pela constitucionalidade desta vedação. E então, os Ministros anteriores eram desconhecedores do Direito? Não entendiam nada de Direito Constitucional? Evidente que não. Esta foi apenas mais uma postura evidente da Corte Superior cedendo à pressão de advogados e em razão da superlotação carcerária, sendo que, ao invés de se construírem mais presídios opta-se por colocar os bandidos na rua.
É isto que necessita ficar claro à sociedade: Quando há duas interpretações possíveis e defensáveis por vários Tribunais e doutrinadores e o Juiz escolhe uma delas, não está ele fazendo um raciocínio jurídico, mas sim optando por uma vertente que externa seu ideologia e posicionamento político (no bom sentido e não no sentido partidário). Assim, deve ele prestar conta à sociedade sobre a responsabilidade social de sua decisão.
DECISÃO PORRETA

Furto de bem penhorado não livra depositário da prisão
Apenas o boletim de ocorrência informando o furto de bens penhorados não livra depositário infiel da prisão. A veracidade de seu conteúdo exige prova complementar. O entendimento é da Seção Especializada em Dissídios Individuais 2 do Tribunal Superior do Trabalho. Os ministros mantiveram o decreto de prisão da sócia da Gráfica Rossi Ltda., de Caxias do Sul (RS), considerada depositária infiel.
A empresária, nomeada depositária de duas máquinas de imprimir etiquetas, avaliadas em R$ 8 mil cada, deveria devolver os bens, mas não o fez, alegando que foram furtados. Após várias tentativas de resolver a questão, a 2ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul determinou a prisão civil da sócia da gráfica, considerada depositária infiel. O juiz apontou manobra fraudulenta por parte da empresária.
Segundo a primeira instância, no processo de execução “figuram como devedores um rol de sócios que têm por costume não cumprir as obrigações judiciais e ocultar patrimônio, servindo-se de vários expedientes ilícitos, dentre os quais criar novas empresas com os mesmos equipamentos”. A 2ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul concluiu que, após ter sido detectada a tentativa de fraude, “os devedores alienaram as máquinas penhoradas, tentando mascarar isso com alegação de furto”.
A sócia entrou com pedido de Habeas Corpus. O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) concedeu a liminar. No entanto, ao receber as informações e analisar o mérito da ação, o TRT gaúcho revogou a decisão. Em mais uma tentativa de barrar a ordem de prisão, a empresária entrou com Agravo Regimental ao TST. Ao julgá-lo, a SDI-2 negou provimento, mantendo, assim, a decisão do TRT.
De acordo com a jurisprudência do TST, o boletim de ocorrência policial, sem outros elementos de convicção, não é suficiente para demonstrar a ocorrência de furto do bem. Para a ministra Kátia Magalhães Arruda, relatora do Agravo, ficou demonstrada a condição de depositária infiel da empresária, devido à inexistência de provas de desvio involuntário ou caso fortuito que esclarecessem a não-restituição dos bens.
AG-HC-181.939/2007-000-00-00.0
Não se trata de uma posição científica asséptica, livre de qualquer responsabilidade, ao contrário, ela carrega toda uma responsabilidade que muitas vezes os julgadores tentam esconder atrás de um pseudo-raciocínio jurídico-científico.
Deveria a sociedade creditar a cada um dos Ministros do STF que votaram favorável à progressão do crime hediondo (que hoje foi corrigida parcialmente, exigindo-se no mínimo 2/5 da pena para o benefício) todos os estupros, assaltos, assassinatos e outros crimes cometidos pelos milhares de bandidos soltos em razão desta decisão e que deveriam estar encarcerados se houvesse cumprimento da lei.
O segundo exemplo é apenas para evidenciar a esquizofrenia abordada no primeiro parágrafo, entre a dissonância total da vontade social e o posicionamento do Judiciário. De tão absurdo, para dar maior credibilidade, passo a transcrever o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul:

AGRAVO CRIMINAL – MINISTÉRIO PÚBLICO – DEFERIMENTO DE PEDIDO DE VISITA ÍNTIMA ENTRE PRESIDIÁRIOS – VISITAÇÃO MEDIANTE ESCOLTA A CADA QUINZE DIAS – UNIDADE DA FAMÍLIA GARANTIDA COSNTITUCIONALMENTE – ART. 226, § 4º CF – GARANTIA À VISITA ÍNTIMA PREVISTA NO ARTITGO, 41, INCISO X, DA LEI 7.210/84 – DIREITO LIMITADO – DECISÃO MANTIDA. A família é a base da sociedade e tem proteção constitucionalmente garantida, assim como a Lei de execuções Penais garante o direito á visita íntima ao apenado, que deve ser deferido com vistas às restrições do caso concreto, posto se tratar de um direito limitado. Não obstante inexista norma legal autorizando o deslocamento, mediante escolta, não está impedido o magistrado de, discricionariamente, deferir pedido feito por apenada para visitar seu esposo, também preso em estabelecimento penal diverso, se esta é a única forma de garantir tais direitos. (Agravo Criminal n. 2006.004378-5, DJMS 1304, de 06/07/06)
Veja-se onde chegamos: o contribuinte brasileiro – que trabalha quase metade do ano para pagar impostos ao governo – terá que arcar com os custos do deslocamento de uma presidiária para que ela possa fazer sexo com outro presidiário! E, como todos sabem a estrutura de nosso aparato policial, se na hora deste transporte, você, cidadão de bem, for assaltado e chamar a polícia, tenha certeza, a resposta será a seguinte: - Infelizmente meu senhor, a nossa única viatura disponível está, com os três únicos agentes de plantão, atendendo às necessidades sexuais de dois presos do sistema carcerário, já que o direito deles é mais importante que o seu.
Não é à toa que, em data recente (23/04/2008), descobriu-se no presídio feminino de Campo Grande – MS a mais nova empresa telefônica do Brasil – a tele-vagina – já que com a adoção de um novo sistema de detecção de metais (um aparelho que as detentas sentam para verificar se não há objetos dentro do corpo), encontrou-se nada menos do que quarenta e três presidiárias com telefones celulares em suas vaginas.
Será que neste caso o Poder Judiciário dirá que o direito à comunicação é um direito básico que não pode ser negado aos presos?
É por todos estes argumentos que, embasado no artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal (“Todo poder emana do povo...”) que defendo a supremacia do princípio democrático sobre este queridismo/garantismo penal que se instalou no País, sendo o mesmo inconstitucional, já que, o que se extrai da população é um só pedido: pau nos criminosos!!!!!

O PARADOXO DO RADICAL CONSERVADOR

Rolando Pancadão
Juiz de Direito da Vara Itinerante de Itu

Havendo acompanhado com interesse a reação de parte da comunidade científica jurídica ao crescente movimento do Direito Penal mínimo, abolicionismo, garantismo, ou qualquer outra denominação nesse sentido, erigindo a última ratio quase que à categoria de soft law, venho parabenizar aqueles que buscam a exata e correta aplicação da lei penal.
Tal proposta vem atender antigo anseio da população, cansada de impunidade e da ineficácia da aplicação da lei penal. Mazelas muitas contribuem para a pouca eficácia da legislação penal brasileira: processo penal anacrônico, desaparelhamento e pouco efetivo das polícias. Todavia, o que não se podia imaginar, e vem sendo sistematicamente verificado, é a própria comunidade científica, ou mesmo o Poder Judiciário, contribuir para tão baixa efetividade.
Sim, porque quando se verificam professores de Direito Penal e juízes defendendo o abolicionismo penal, garantismo, e a aplicação plena e irrestrita de teorias européias, o que se constata é, em verdade, o discurso pela ineficácia da lei penal. E o que é pior: muitos advogados, professores e magistrados repetem, em triste macaquice colonial, teorias do estrangeiro que não se amoldam à realidade nacional, e, sobretudo, à nossa legislação. Síndrome de um país que ainda não atingiu a maturidade, continuamos a achar que tudo o que se comenta no estrangeiro é bom e aqui deve ser replicado. E queremos, por fim, impor a fórceps, teorias alemãs e outras (que lá já são bem antigas, mas aqui são repetidas como o supra-sumo da modernidade) à nossa legislação, querendo encaixar o triângulo no quadrado.
O brasileiro é, como dizia Nelson Rodrigues, um narciso às avessas, pois cospe na própria imagem. Por que não é corretamente aplicada a legislação penal? Por que copiar modelos alemães, suíços ou outros, que não nos servem, que não condizem com nossa realidade, e que não garantem, isso sim, a segurança dos cidadãos brasileiros ?
E o que é pior: observa-se, no meio acadêmico, o preconceito contra aqueles que defendem a aplicação da lei penal. São chamados de radicais, quando, na verdade, nada têm disso. São, em princípio, conservadores, pois apenas querem a efetividade da ordem jurídica.
Criou-se, assim, no Brasil, o paradoxo do radical conservador: como vivemos em país onde não se aplicam as leis, aquele que deseja sua efetividade é um radical.
Se defender a aplicação da lei é ser radical, sejamos radicais. Mas jamais repetidores ventríloquos de teorias estrangeiras que nem sempre se amoldam à realidade pátria. Não é possível que ser moderno é defender a impunidade, pois essa leva à barbárie e ausência de lei, que retratam justamente tempos imemoriais, estes sim, de atraso total.
Assim sendo, parabenizo esses jovens doutrinadores e aplicadores do Direito que, percebendo a urgência na aplicação das sanções penais, erigiram cidadela na defesa do Direito Penal, que, se não foi feito para resolver todos os casos, pois é a mais forte das sanções, também não pode ser transformado em um Direito de brincadeirinha, em que professores gritam sua pretensa modernidade, sem perceber que eles sim, estão presos, atrás das grades dos condomínios.

A INDISCUTÍVEL CONSTITUCIONALIDADE DA PRESUNÇÃO DE CULPABILIDADE DOS INDICIADOS

Des. Décio K. Cette.


Nos dias atuais é preciso analisar e reler, com visão prática e crítica, alguns princípios do direito penal cunhados há séculos e que, embora sacralizados pelos amantes da impunidade que se escudam sob um tal Direito Penal Mínimo, não condizem com a realidade vivida por todos, nem tampouco encontram, hodiernamente, guarida no ordenamento jurídico vigente.

Um desses princípios totalmente ultrapassados é o da presunção da inocência, que, a nosso sentir, não pode ser invocado em casos em que os investigados pela prática de crimes foram devidamente investigados e restaram formalmente indiciados. A presunção de inocência não pode ter um alcance ilimitado a ponto de ser aplicada a toda e qualquer situação que envolva a prática de um delito.

Ora, o ato de indiciamento, quando devidamente motivado, é ato administrativo perfeito, que goza de presunção de veracidade e legalidade por ser emanado formalmente da Administração Pública. 

Assim, após o indiciamento formal, não se mostra possível presumir a absoluta inocência do cidadão. 

Maior razão existe para não se aplicar o dito princípio quando o indiciado for denunciado pelo Ministério Público e a denúncia recebida pelo Judiciário.

Em casos tais, quando a Administração da Justiça se pronuncia – ainda que provisoriamente - pela possível responsabilidade criminal do investigado, o que deve prevalecer até o desfecho do processo criminal é a presunção da culpabilidade e todo o processo criminal deve se nortear pelo brocardo in dubio pro societate.

A presunção de inocência, sem dúvida, é atributo que deve favorecer a todos aqueles que não estão indiciados pela polícia e nem respondem a processos criminais. Ou seja, é um status que deve sempre amparar os cidadãos de bem, que não tiveram sua conduta formalmente repreendida pelo aparelho estatal de combate à criminalidade.

Entendimento diverso implicaria em evidente malferimento a um princípio constitucional maior, que é o da isonomia, que assevera que devemos tratar os desiguais de forma desigual.

Seria admissível um cidadão de conduta imaculada e ficha limpa receber do ordenamento jurídico brasileiro o mesmo tratamento que deve ser dado a Alexandre Nardoni, Ana Carolina Jatobá e Eduardo Cunha ?

Precisamos deixar de lado a cômoda lógica teletubiana (Teletubies são aqueles personagens infantis que sempre repetem mecanicamente o que os outros dizem precedentemente, acrescentando a frase “de novo”) de insistir em aplicar o raciocínio feito por Cesare Beccaria e outros doutrinadores - cujo pensamento nada condiz com a realidade atual - há mais de três séculos atrás. 

Vivemos novos tempos. Precisamos analisar o ordenamento jurídico sem preconceitos e em busca da efetiva justiça, sob pena de condenarmos a sociedade a viver encarcerada em suas próprias casas enquanto os bandidos tomam conta das ruas, assassinando, sequestrando, estuprando e roubando cidadãos de bem.

Aqueles que se dispuserem a um raciocínio isento de preconceitos e voltados para a realidade social, certamente concordarão: a presunção de culpabilidade é inquestionável quando o aparelho estatal se pronunciar formalmente sobre a responsabilidade criminal de um indivíduo. Ao indicado meliante (e não à sociedade) incumbirá o ônus de demonstrar o contrário. A condenação penal transitada em julgado apenas tranformará a presunção juris tantum de culpabilidade em presunção jure et jure.

Nada mais.