sexta-feira, 29 de agosto de 2008

FESTA JUNINA: A QUADRILHA, OS JUÍZES E OS TAXISTAS DE BELÉM

FESTA JUNINA:
A QUADRILHA, OS JUÍZES E OS TAXISTAS DE BELÉM

Rolando Pancadão
Juiz de Direito da Vara Itinerante de Itu

Recentemente estive em Belém, para proferir palestra em evento jurídico. Sendo mês de junho, aproveitei o tempo livre à noite para assistir a uma quadrilha organizada pela Prefeitura Municipal.
Interessante verificar como o folclore brasileiro é rico: as quadrilhas eram muito bem organizadas, com líder e comandados em perfeita sintonia; julguei ainda bastante peculiar serem fomentadas pelo Poder Público.
Havia, associados à quadrilha, além do forró e xaxado, pipoca, milho cozido e quentão, concursos de ordem vária: Miss Caipira, Miss Simpatia e Miss Mulata Cheirosa. Chamei outros juízes para presenciarem a quadrilha, mas, não sei por quê, os integrantes do Judiciário brasileiro seguem insistindo em não enxergar quadrilha alguma, por mais perto e evidente que ela esteja, ou barulhenta que seja e com grande número de pessoas que tenha. Os membros do Ministério Público presentes ao evento também insistiram para que os juízes vissem a quadrilha, mas não adiantou.
Deixou-me intrigado outra característica da amazônica cidade. Ao solicitar um táxi, tão logo fornecia o destino, sempre em região central, de que não me afastei, e os taxistas diziam que não conheciam a rua indicada. Durante o trajeto, repetiam perguntas do tipo “como chama a rua mesmo?” pois não se lembravam para onde estavam indo. E ficava eu, todo o tempo, repetindo o destino desejado, e os motoristas me devolvendo a pergunta, ao passo que davam voltas e mais voltas. Os taxistas de Belém parecem que não sabem para onde vão.
Seriam alguns juízes taxistas de Belém? Ao receberem o pedido constante na inicial, não fazem, ou parecem não fazer, a menor idéia do que está sendo discutido. Se o pedido versar sobre interesses difusos, aí sim, estaremos falando de um fantástico mundo novo, região desconhecida da cidade. Se se pede tutela antecipada sem oitiva do réu, aguardam a contestação. Sem se manifestar sobre a tutela, vinda a contestação, abrem vistas para impugnação.O autor reitera o pedido de tutela, e nada. E até nos processos mais tradicionais, ficam dando voltas e mais voltas, sem chegar à sentença, devolvendo o processo ao autor, que, tal como o passageiro, durante inúmeras vezes no itinerário processual, vê-se obrigado a repetir o destino desejado, a tão almejada decisão final, que já pleiteara na vestibular, ou ao sentar no banco do táxi.
E os juízes, tal como os taxistas, devolvem a pergunta: é para onde mesmo? Qual o nome da rua?, indagações essas muitas vezes travestidas nos famosos despachos caninos “au-au” (“vista ao...”, “vista ao...”), evidenciando que não fazem a menor idéia para onde estejam indo.
Enquanto os taxistas de Belém dão voltas, o preço da corrida aumenta, enervando o passageiro; enquanto os juízes protelam a decisão, a sensação de injustiça e impunidade crescem, desesperançando o povo brasileiro.
Por taxistas que saibam o mapa da cidade; por juízes que, em vez de darem voltas e mais voltas no processo, cheguem eficazmente ao seu destino, que é a sentença, é o que quem visita Belém e a população esperam.

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